Mirando as ausências: notas sobre a inserção do povo negro na educação pública formal brasileira

Palavras-chave: Educação dos/das negros/negras, História da Educação, Relações Étnico-raciais

Resumo

O objetivo desse texto é refletir acerca das ausências e interdições as quais o povo negro foi submetido ao longo dos séculos na educação formal brasileira. Com isso, desejamos construir uma reflexão sobre o racismo analisando a história da educação formal no Brasil. Para isso, recorremos à pesquisa bibliográfica como recurso metodológico, tomando como objeto de análise documentos oficiais da História da Educação brasileira, em diálogo com as contribuições dos estudos das relações étnico-raciais o Brasil. Nossas reflexões estão ancoradas na teoria latino-americana da modernidade/colonialidade, no pensamento social afro-brasileiro e nos estudos da crítica pós-colonial. Por meio das reflexões que realizamos neste texto é possível dizer que a História da educação brasileira é marcada pela lógica colonial racista e manteve os negros e negras fora do processo de escolarização formal por séculos. Foi possível perceber que apesar das significativas mudanças políticas e sociais vividas ao longo do século XX, sobretudo desde a redemocratização do país no final da década de 1980, para o processo de inclusão do povo negro na educação formal, ainda há muito que se fazer para a construção de uma sociedade e educação, de fato, inclusiva, equânime e antirracista. Por fim, destacamos, que é um dever ético da educação, e de toda a sociedade, a mobilização em direção ao combate do racismo e à construção de uma educação erguida nos princípios democráticos de equidade e justiça.

Palavras-chaves: Escolarização dos/das negros/negras. História da Educação. Relações Étnico-raciais.

 

ABSTRACT: The purpose of this text is to reflect on the absences and prohibitions to which the black people have been subjected over the centuries in formal Brazilian education. With that, we wish to build a reflection on racism in the history of formal education in Brazil. For this, we resort to bibliographic research as a methodological resource, taking official documents from the History of Brazilian Education as an object of analysis, in dialogue with the contributions of studies of ethnic-racial relations in Brazil. Our reflections and analyzes are anchored in the Latin American theory of modernity / coloniality, in Afro-Brazilian social thought and in the studies of post-colonial criticism. Through the reflections that we carry out in this text, it is possible to say that the History of Brazilian education is marked by racist colonial logic and kept black men and women out of the formal schooling process for centuries. It was possible to realize that despite the significant political and social changes experienced during the 20th century, especially since the country's redemocratization in the late 1980s, for the process of including black people in formal education, there is still much to be done to the construction of a society and education, in fact, inclusive, equitable and anti-racist. Finally, we emphasize that it is an ethical duty of education, and of the whole of society, to mobilize towards the fight against racism and the construction of an education based on democratic principles of equity and justice.

Keywords: Black people education. Ethnic-racial relations. History of education.

RESUMEN: El propósito de este texto es reflexionar sobre las ausencias e interdicciones a las que han sido sometidos los negros durante siglos en la educación formal brasileña. Con esto, queremos construir una reflexión sobre el racismo analizando la historia de la educación formal en Brasil. Para ello, recurrimos a la investigación bibliográfica como recurso metodológico, tomando como objeto de análisis documentos oficiales de la Historia de la Educación Brasileña, en diálogo con los aportes de los estudios de las relaciones étnico-raciales en Brasil. Nuestras reflexiones están ancladas en la teoría latinoamericana de la modernidad / colonialidad, en el pensamiento social afrobrasileño y en los estudios de la crítica poscolonial. A través de las reflexiones que realizamos en este texto, es posible decir que la Historia de la educación brasileña está marcada por la lógica colonial racista y mantuvo a los hombres y mujeres negros fuera del proceso de escolarización formal durante siglos. Se pudo constatar que a pesar de los importantes cambios políticos y sociales experimentados durante el siglo XX, especialmente desde la redemocratización del país a fines de la década de 1980, para el proceso de inclusión de la población negra en la educación formal, aún queda mucho por hacer para la construcción de una sociedad y educación, de hecho, inclusiva, equitativa y antirracista. Finalmente, destacamos que es un deber ético de la educación, y de toda la sociedad, movilizarse hacia la lucha contra el racismo y la construcción de una educación basada en principios democráticos de equidad y justicia.

Palabras-clave: Escolarización de los negros. Historia de la educación. Relaciones étnico-raciales.

Biografia do Autor

João Augusto dos Reis Neto, Universidade Federal de São João Del Rei

Mestre em Educação, pesquisador no Grupo de Pesquisa Laroyê (UFLA). 

Referências

ALMEIDA, Marco Antonio Bettine de; SANCHEZ, Livia. Os negros na legislação educacional e educação formal no Brasil. Revista Eletrônica de Educação, São Carlos, v. 10, n. 2, p. 234-246, fev. 2016.

ALMEIDA, Silvio. Racismo estrutural. São Paulo: Editora Pólen, 2018.

ARROYO, Miguel. Outros Sujeitos, Outras Pedagogias. Petrópolis: Vozes, 2012.

BARROS, Surya A. Pombo de. Discutindo a escolarização da população negra em São Paulo entre o final do século XIX e início do XX. In: ROMÃO, Jeruse (Org.). História da educação dos negros e outras histórias. 1. ed. Brasília: MEC, 2005, p. 79-82.

BENTO, Maria Aparecida S. Branqueamento e branquitude no Brasil. In: CARONE, Iray; BENTO, Maria Aparecida. S. (Org.). Psicologia Social do Racismo: estudos sobre branquitude e branqueamento no Brasil. 6. ed. Petrópolis: Vozes, 2014, p. 25-58.

BRASIL. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Brasília: MEC, 2004. Disponível em: <http://portal.inep.gov.br/informacao-da-publicacao/-/asset_publisher/6JYIsGMAMkW1/document/id/488171>. Acesso em: 28 mar. 2019.

BRASIL. Lei n° 10.639/03, de 9 de janeiro de 2003. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-Brasileira", e dá outras providências. Brasília: Ministério da Educação, 2003. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2003/L10.639.htm>. Acesso em: 28 mar. 2019.

BRASIL. Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961. Fixa as diretrizes e bases da educação nacional. Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Brasília: Ministério da Educação, 1961. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/Ccivil_03/leis/L4024.htm>. Acesso em: 28 mar. 2019.

BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília: Ministério da Educação, 1996. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9394.htm>. Acesso em: 28 mar. 2019.

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: apresentação dos temas transversais, ética. Brasília: MEC/SEF, 1997. Disponível em:

< http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro081.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2019.

COSTA, Emilia Viotti. da. O mito da democracia racial brasileira. In: _____________________. Da monarquia à república: momentos decisivos. 8. ed. São Paulo: Fundação Editora UNESP, 2007, p. 365-384.

CURY, Carlos R. Jamil. Direito à educação: direito à igualdade, direito à diferença. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n. 116, p. 242-245, jul. 2002.

CURY, Carlos R. Jamil. Perspectivas da educação brasileira e a LDB. Revista de educação do Cogeime, Belo Horizonte, n. 12, p. 7-20, jun. 1998.

DIAS, Lucimar Rosa. Quantos passos já foram dados? A questão de raça nas leis educacionais – da LDB de 1961 à Lei 10.639, de 2003. In: ROMÃO, Jeruse. (Org.). História da educação dos negros e outras histórias. 1. ed. Brasília, MEC/SECAD, 2005. p. 49-62.

FONSECA, Marcus V. A educação dos negros: uma nova face do processo de abolição do trabalho escravo no Brasil. Educação em Revista, set. 2000.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Esperança. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 42. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2005.

GOMES, Nilma Lino. Diversidade étnico-racial, inclusão e equidade na educação brasileira: desafios, políticas e práticas. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, Goiânia, v. 27, n. 1, abr. 2011a.

GOMES, Nilma Lino. O movimento negro no Brasil: ausências, emergências e a produção de saberes. Política & Sociedade (Online), Florianópolis, v. 10, n. 18, p. 133-154, abr. 2011b.

GOMES, Nilma Lino. Relações étnico-raciais, educação e descolonização dos currículos. Currículo sem Fronteiras, v. 12, n. 1, p. 98-109, 2012.

GONÇALVES, Luiz Alberto Oliveira; SILVA, Petronilha Beatriz Gonçalves e. Movimento negro e educação. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, n. 15, p. 134-158, dez. 2000.

GONDRA, José; SCHUELER, Alessandra. Educação, Poder e Sociedade no Império Brasileiro. São Paulo: Cortez, 2008.

HENRIQUES, Ricardo. Raça & Gênero nos sistemas de ensino: os limites das políticas universalistas em educação. Brasília: Unesco, 2002.

JESUS, Samuel de. O Negro na Educação Brasileira. Revista Vozes do Vale – UFVJM, Diamantina, v. 1, p. 1, 2012.

LEITE, Valderlei Furtado. Candomblé e educação: dos ilês às escolas oficiais de ensino. 2006. 138f. Dissertação (Mestrado em Programa Interdisciplinar em Educação, Comunicação e Administração), Universidade São Marcos, São Paulo, 2006.

LOPES, Ademil. Escola, socialização e cidadania: um estudo da criança negra numa escola pública de São Carlos/SP. São Carlos: EDUFSCar, 1995.

LÜDKE, Menga; ANDRÉ, Marli E.D.A. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 1986.

MALDONADO-TORRES, Nelson. Sobre la colonialidad del ser: contribuciones al desarrollo de un concepto. In: CASTRO-GÓMEZ, Santiago; GROSFOGUEL, Ramón (orgs.). El giro decolonial: reflexiones para una diversidad epistémica más allá del capitalismo global. 21 edición. Bogotá: Siglo del Hombre, 2007, p. 127-168.

MBEMBE, Achille. Crítica da razão negra. Lisboa: Antígona, 2014.

MBEMBE, Achille. Necropolítica. São Paulo: N-1 Edições, 2018.

MONTALVÃO, Sérgio. A LDB de 1961: apontamentos para uma história política da educação. Revista Mosaico, São Paulo: FGV, Ano 2, n. 3, jul. 2010. p. 21-39.

MORAIS, Christianni Cardoso. Humanamente indispensável. Revista do Arquivo Público Mineiro, v. 2, p. 36-51, 2012.

NASCIMENTO, Abdias do. O Genocídio do Negro Brasileiro: processo de um racismo mascarado. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978.

NOGUEIRA, Juliana Keller; FELIPE, Delton Aparecido; TERUYA, Teresa K. Conceitos de Gênero, etnia e raça: reflexões sobre a diversidade cultural na educação escolar. In: Seminário Internacional Fazendo Gênero – corpo, violência e poder, 8. ed. 2008, Florianópolis. Anais eletrônicos do Seminário Internacional Fazendo Gênero – corpo, violência e poder. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina, p. 1-10, 2008.

QUIJANO, Aníbal. Colonialidad del poder, cultura y conocimiento en América Latina. Ecuador Debate, Quito (Equador), n. 44, p. 227-238, ago. 1998.

RIBEIRO, Djamila. Pequeno manual antirracista. 1. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.

RODRIGUES, Tatiane Cosentino. Movimento negro no cenário brasileiro: embates e contribuições à política educacional nas décadas de 1980-1990. 2005. 114f. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais), Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2005.

ROMÃO, Jeruse. (Org.). História da educação dos negros e outras histórias. Brasília/DF: Ministério da Educação, 2005. p. 50-65.

ROSEMBERG, Fúlvia. Diagnóstico sobre a situação educacional de negros (pretos e pardos) no estado de São Paulo. São Paulo: Fundação Carlos Chagas, 1996. 2 v. Disponível em: < http://publicacoes.fcc.org.br/ojs/index.php/cp/article/download/1264/1267>. Acesso em: 20 mar. 2019.

RUFINO, Luiz. Pedagogia das encruzilhadas. Rio de Janeiro: Editora Mórula, 2019.

SANTOS, Cledineia. Educação, estudos pós-coloniais e decolonialidade: diálogos com a Lei 11.645/08. Odeere – Revista do Programa de Pós-graduação em Relações Étnicas e Contemporaneidade, v. 3, n. 5, p. 161-174, jan./jun. 2018b.

SANTOS, Gabriela Cordeiro. O processo de escolarização do negro na Primeira República (1889-1930). In: XIII CONGRESSO LUSO-AFRO-BRASILEIRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS, 8. Ed., 2018, São Paulo. Anais do XIII Congresso Luso-afro-brasileiro de ciências sociais, São Paulo: Universidade Federal de São Paulo, 2018a, p. 1-3.

SAVIANI, Dermeval. Política e educação no Brasil: O papel do Congresso Nacional na legislação de ensino. Campinas: Autores Associados, 1999.

SILVA, Geraldo da; ARAÚJO, Márcia. Da interdição escolar às ações educacionais de sucesso: escolas dos movimentos negros e escolas profissionais, técnicas e tecnológicas. In: SKLIAR, Carlos B. A pergunta pelo outro da Língua, a pergunta pelo mesmo da língua. Prefácio. In: LODI, Ana Claudia Bailiero; HARRISON, Kathryn Marie Pacheco; CAMPOS, Sandra Regina Leite de.; TESKE, Ottmar (Org.). Letramento e minorias. 8. ed. Porto Alegre: Mediação, 2012. p. 5-12.

TRIUMPHO, Vera R. Santos. Coletivo Estadual de Educadores Negros: Compromissos com a educação das relações étnico-raciais. Identidade, v. 6, p. 21-26, 2004.

VEIGA, Cynthia Greive. Escola pública para os negros e os pobres no Brasil: uma invenção imperial. Rev. Bras. Educação, v.13, n.39, p. 502-516, dez. 2008, Diana. As lentes da história: estudos de história e historiografia da educação no Brasil. Campinas/SP: Autores Associados, 2003.

Publicado
2020-12-30